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Carta de Belém do Pará – VII Oficina para Inclusão Digital

Nesta sétima edição da Oficina de inclusão digital, entidades da sociedade civil envolvidas com os temas centrais das tecnologias de informação e comunicação para o desenvolvimento humano, econômico e social, apresentam sua pauta para a formulação de uma política pública, integradora neste campo. Esta carta expressa um consenso trabalhado a partir dos avanços já consolidados na VI Oficina de Salvador. Os que a subscrevem assumem o compromisso público de fazê-la circular amplamente entre gestores públicos nas diferentes esferas governamentais e repercuti-la junto às demais entidades da sociedade civil.

Desde a realização da primeira Oficina para inclusão digital, em 2001, o país vem alcançando parte das metas propostas pela sociedade civil para inclusão digital. Exemplos disso são as iniciativas de recondicionamento de equipamentos e metareciclagem; o uso e a migração para Software Livre nas iniciativas públicas e governamentais de inclusão digital; a política de desenvolvimento de Software Públicos e a criação de um Grupo de Trabalho para definir a integração das iniciativas de inclusão digital no País.

Superando obstáculos e divergências, construímos um discurso comum que orienta nossas ações. A inclusão digital está presente em várias ações do Governo Federal, que agora convergem para uma ação unificada.

Mas há uma questão grave, que tem impacto negativo sobre a causa da inclusão digital. Esta carta repudia o Projeto de Lei 84/99 (ex-PLC 89/03), que trata “dos crimes contra a segurança dos sistema informatizados”. Aprovado no Senado no dia 9 de julho, este projeto continua em tramitação no Congresso Nacional. Entendemos que esta proposta inviabiliza a inclusão digital no Brasil. O projeto é nocivo para a sociedade, porque trata o compartilhamento de conhecimento como crime, sem a existência de uma legislação que trate de direitos na internet.

Os artigos 285-A, 285-B, 163-A, 171 e 22 implantam uma situação de vigilantismo na rede. Os defensores do projeto dizem que eles visam impedir ações criminais na internet, mas eles não serão eficazes para isso. Na verdade, abrem espaço para a violação de direitos civis básicos. Em síntese, o projeto coloca em risco a política de ampliação das redes abertas comunitárias de banda larga, a liberdade de compartilhamento, de expressão, de criação, de acesso, de privacidade e o direito ao anonimato.

Diante disso, reiteramos nosso repúdio ao Projeto de Lei em questão. Propomos que ele seja retirado da pauta, porque sua aprovação vai coibir o avanço da liberdade de expressão e de criação. Propomos ainda que se abra um debate público com todos os interessados, na busca da criação de uma nova lei que regule adequadamente o tema. Sem ferir as redes abertas, a liberdade de expressão e a inclusão e a cultura digital.

Nós insistimos que o Brasil precisa de uma política pública integrada que coloque a cidadania no horizonte da sociedade da informação. Sendo assim, reivindicamos um conjunto de ações gerais para uma política pública de tecnologias de informação e comunicação a serviço da inclusão
digital:

1.Que todas as esferas de governo desenvolvam e implementem planos de inclusão digital como forma de integrar ações, racionalizar e otimizar
recursos públicos. É importante que a sociedade civil visualize de forma precisa qual ente governamental coordena e responde pelas ações de
inclusão digital, de forma a poder participar do debate, contribuir e fiscalizar;

2.Que se amplie e dissemine o debate com toda sociedade civil visando construir consenso para avançar na implementação de marcos regulatórios e de políticas públicas que assegurem a sustentabilidade e permanência de iniciativas de inclusão digital. Isso vai superar os obstáculos
que se interpõem num contexto de descontinuidades geradas pelas mudanças de gestão;

3.Que os diversos programas sociais e políticas públicas, voltados para assistência social, criança e adolescente, inserção produtiva, educação de jovens e adultos tenham como um de seus componentes as ações de inclusão digital;

4.Liberação imediata dos fundos públicos, em especial do FUST, para a implantação de programas e projetos de inclusão digital por parte dos
governos federal, estaduais e municipais, bem como diretamente por organizações da sociedade civil;

5.Uma política pública que estimule a redução significativa dos preços de conexão à Internet, tanto para o usuário final como para os provedores locais de serviços de Internet;

6.Assegurar recursos públicos e um marco legal habilitador para a implementação de estratégias de municípios digitais que contemplem projetos de inclusão digital públicos e gratuitos como redes de conexão à internet comunitárias, telecentros comunitários e conexões
compartilhadas;

7.Monitoramento sistemático e regular das metas de universalização dos contratos de concessão na área de telecomunicações, para garantir amplas facilidades para iniciativas locais de inclusão digital;

8.Acesso isonômico aos pontos de presença das espinhas dorsais em cada município, tanto para provedores de serviços locais como para iniciativas de inclusão digital, bem como garantia regulatória que esses pontos de presença tenham banda de alta disponibilidade à medida que expandam sua utilização no município;

9.Que as iniciativas de inclusão digital se aliem a um verdadeiro processo de democratização dos meios de comunicação, reconhecendo e incrementando as rádios comunitárias;

10.Que as iniciativas de inclusão digital assegurem uma gestão participativa das comunidades onde estão localizadas e que este seja um critério preponderante nos editais públicos;

11.Que as políticas de inclusão digital fomentem o associativismo, o cooperativismo e as ações de economia solidária;

12.Fortalecer e incentivar iniciativas de inclusão digital que promovam as línguas, os dialetos, as identidades culturais, regionais e étnicas;

13.Que os planos de inclusão digital venham acompanhados de medidas efetivas de promoção da transparência e acesso livre à informação pública e de avanços de políticas de governo eletrônico, ocasionando uma maior participação da sociedade na esfera pública;

14.Que os ambientes de inclusão digital estejam de acordo com a legislação vigente no país e acordos internacionais que tratam a questão da acessibilidade, garantindo às pessoas com deficiência o acesso aos bens e serviços públicos;

15.Implementar ações eficazes junto aos incluídos digitalmente, trabalhando de forma crítica e construtiva o tema da conscientização sócio-ambiental;

16.Incentivo a iniciativas de inclusão digital relacionadas à formação, produção e compartilhamento de informação, conteúdo e de conhecimento;

17.Que o desenvolvimento da TV digital garanta a interatividade plena a todos os cidadãos e cidadãs, viabilizando a interface entre TV e serviços IP, além da produção e difusão de conteúdos livres pela sociedade civil, com a garantia de canais públicos de veiculação disponíveis no espectro em todos os municípios em que a tecnologia for implementada e sem limitação de cópias em alta definição para materiais com licenças abertas;

18.Que as políticas públicas de inclusão digital incluam as questões de gênero, raça, LGBT (gays, lésbicas, bissexuais e transgêneros), os povos indígenas, quilombolas, assentamentos rurais e as comunidades de pescadores;

19.O Governo Federal deve, de forma efetiva, investir e alavancar investimentos para iniciativas de inclusão digital através da criação de um sistema que viabilize recursos para a remuneração dos que trabalham diretamente nas unidades instalada dos projetos;

20.Incentivar a criação de redes de formação continuada dos recursos humanos que trabalham em projetos de inclusão digital, assim como de redes de compartilhamento e de trocas de experiências e conteúdos;

21.Que os planos de inclusão digital e programas de expansão de conectividade e infra-estrutura lógica fomentados pela esfera pública
cheguem às regiões remotas e isoladas, bem como localidades de baixa densidade populacional;

22.Apoiar a consolidação do sistema brasileiro de governança da Internet, conduzido pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), para
estimular o debate nacional sobre os temas da governança da Internet discutidos nos fóruns internacionais;

23.Reafirmamos a defesa da realização de uma Conferência Nacional de Comunicação ampla, democrática e participativa, construída a partir de etapas locais e regionais, com apoio e participação dos setores envolvidos em projetos de inclusão digital;

24.Reivindicamos a criação em lei do Conselho Nacional de Inclusão Digital, com ampla participação de entidades da sociedade civil e movimentos sociais. O conselho deve participar da definição das principais diretrizes da política pública de inclusão digital do país, bem como do co-gerenciamento dos recursos públicos previstos para esse fim. A iniciativa deve ser replicada nos Estados e Municípios;

25.Que os planos e ações de inclusão digital venham acompanhados de metodologias e projetos pedagógicos, que levem em conta as particularidades regionais, e agregue possibilidades de integrar didática, formação humana e profissional.

Subscrevem esta carta:
Cidadania Digital
Coletivo Digital
Intervozes
Associação Software Livre
Rede Marista de Solidariedade (RS)
Rits
Sampa.org
Projeto Saúde & Alegria

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